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quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Química da paixão

Desde minha mais tenra idade, sempre apreciei dias chuvosos. Tanto por seu frescor, umidade relativamente alta do ar e suave toque de gotas pela janela. Outro fator importante é que era praticamente obrigada a permanecer onde estava; o que contribui para uma maior concentração nas atividades que realizo. De qualquer forma ou qualquer motivo, hoje é um desses dias e vou aproveitá-lo.

Um algo que nos remete nesses dias de chuva é àquele ‘programa de índio’ com a pessoa amada, seja namorando, assistindo filme, fazendo brigadeiro ou uma ‘DR’[1]. E como é estranho o que chamamos de amor! Duas pessoas com cognições diferentes, vivendo vidas diferentes, mas que incessantemente se procuram, e quando se encontram é como se ‘estivessem completos’. Mas, você já parou para pensar no que ocorre com o seu corpo nesse encontro?

Beleza que agrade nossos padrões, mesmo esses não sendo os do resto do mundo, é sim importante. Ela um dia passa, é totalmente frágil e mutável, mas convenhamos, tem que nos agradar. Porém não é o que nosso organismo avalia de prima. O cheiro sim é um fator que avaliamos inconscientemente. E não é o bom cheiro de um perfume amadeirado em dia frio, mas de um conjunto de genes conhecido como MHC[2]. Esses genes controlam nosso sistema imunológico e influencia na rejeição de tecidos. Mesmo que você não conheça a estrutura cognitiva de quem está se interessando, é fato que se tratando de MHC os opostos se atraem, visto que pessoas com esse conjunto de genes parecido têm maior índice de rejeição do feto na ocasião de uma gravidez. Por isso, se um deus(a) grego aparecer em sua frente e demonstrar grande interesse, mas infelizmente não rolar aquela química, não se preocupe. Talvez ele(a) não seja mesmo a pessoa certa para você – ou para seus descendentes.

Ainda falando em cheiro, há um componente liberado para comunicar comportamentos, entre eles o sexual: o feromônio. Mesmo que em menor escala do que nos animais sentimos a intenção de outra pessoa inconscientemente.

O Criador de tudo isso não nos limitou a um amor somente voltado para a procriação, para os componentes biológicos que nos formam, mas principalmente para complementar nossa cognição. Características como bom humor pesa muito, uma vez que são associadas com a inteligência – fator fundamental, pelo menos falando por mim. Vivencias sendo compartilhadas, experiências aproveitáveis, diálogos suaves são muito importantes no jogo da sedução.

Nada como o primeiro beijo com alguém. Experiência inesquecível seja ela positiva ou negativa. Através do beijo percebemos muito da pessoa. O MHC também está presente na saliva, e ele amplia os sentidos do olfato, tato e visão. Mas o beijo contém uma áurea mágica, com uma linguagem própria. Costumo falar que absolutamente tudo reflete o que somos – modo de conversar, sentar, gosto musical, gastronômico, profissão de interesse, gênero de leitura – e com o beijo não é diferente. Se a pessoa possui personalidade forte, é romântica ou ‘pra frente’ percebemos no ato de beijar. É muito difícil, ou quase impossível quando encontramos um alguém que consiga compreender e corresponder sem ter que praticar muito essa nossa linguagem. É uma espécie de dialeto que não pode ser forjado, e se houver compreensão é uma tradução do que não pode ser dito.

Depois de passar por tantas seleções – psicológicas e fisiológicas – e permitir que alguém tome um lugar tão importante e isolado (o amor eros, do grego que se refere ao amor entre homem e mulher) é como estar fazendo qualquer outra atividade em dia ensolarado, mesmo apenas estando namorando, assistindo filme, fazendo brigadeiro ou uma ‘DR’ com o(a) eleito(a) num dia chuvoso.


Monique, primavera chuvosa de 2008.


[1] O famoso ‘Discutir a Relação’, do qual muitos fogem.
[2] Complexo de Histo-compatibilidade Principal – sigla traduzida do inglês.

4 comentários:

rafaj disse...

E alumia mesmo não é?

Gosto dos teus textos.
Seleciono várias passagens para pôr aqui, mas acabo que fico com a última que copio, que aliás, tem a ver com o último poema: "É uma espécie de dialeto que não pode ser forjado, e se houver compreensão é uma tradução do que não pode ser dito." Maravilhoso isso, você forjou o significado de um beijo.

Também aprecio dias chuvosos...

Carol Monique disse...

Forjei mesmo o significado?
Vindo de quem veio, me sinto completamente lisonjeada!

São os dias chuvosos que fazem isso...

Monique, primavera de 2008

L. Damasio disse...

Quanta inspiração! Existem coisas que não são fáceis de descrever. Parabéns! Acredito que você tenha conseguido captar como poucos a essência de um momento, assim como de todo o resto pertinente a este assunto.

Anônimo disse...

Realmente os textos estão exelentes. Achei muito massa os detalhes em geral.
Parabéns, vc é praticamente uma Dráuzio Varella virtual.

Gosto mais de dias ensolarados.

bjs.